NEGÓCIOS

Bancos se preparam para reagir a mudanças no cartão de crédito.

Os bancos reclamam que o negócio de cartões tem vários custos invisíveis para o público.

Em 12/01/2017 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

COLUNA - São Paulo - A limitação do uso do rotativo deve pressionar as margens dos bancos com cartões de crédito, e para compensar eles já esboçam seguintes medidas como aumento de tarifas, redução de limites dos clientes e pressão pelo fim das compras parceladas sem juros, como forma de reequilibrar a relação entre custos e despesas no negócio.

Publicamente, as instituições financeiras afirmam que o teto de 30 dias para o rotativo, linha mais cara do mercado com juros de cerca de 500 por cento ao ano, é positiva para o mercado, por induzir donos de cartões a buscarem linhas mais baratas para rolagem das faturas. O limite entrar em vigor a partir de abril.

Reservadamente, no entanto, os bancos avaliam que uma mudança brusca pode desequilibrar a estrutura de custos e despesas. Hoje, o juro do rotativo é o que praticamente garante a lucratividade dos emissores, arcando com os custos dos emissores, especialmente de reservas de capital.

"É inconsistente mexer em um pilar do mercado sem mexer em todos", disse à Reuters o chefe da área de cartões de um grande banco, sob condição de anonimato. "Tem que encontrar um novo ponto de equilíbrio", disse outro representante do setor bancário, que também pediu para não ser identificado.

Os bancos reclamam que o negócio de cartões tem vários custos invisíveis para o público, que terão que ser custeados de alguma outra forma quando o rotativo perder expressão.

Um deles é o chamado parcelado sem juros, instrumento pelo qual são os lojistas financiam os clientes. Embora não tenham custo inicial com essas operações, os bancos arcam com o risco de crédito dos clientes, inclusive com reserva de capital prudencial. Porém, acabar ou reduzir essa modalidade dependeria de um acordo mais amplo, o que não parece factível num horizonte próximo, já que lojistas não devem abrir mão de qualquer tipo de venda diante da uma economia em recessão.

Outro exemplo de custo são os limites de gastos que os bancos concedem aos clientes. Como têm menos flexibilidade para mexer nesses limites, as instituições são obrigadas a ter uma espécie de poupança para o caso dessas linhas serem usadas e não pagas.

Isso ajuda a explicar porque o juro do cartão é mais alto do que o do cheque especial, cujos limites de crédito são mexidos com frequência pelos bancos, especialmente quando percebem que o risco do cliente aumenta.

Além disso, clientes que não usam o rotativo na prática não dão lucro para os bancos, especialmente aqueles que, por razões comerciais, gozam de isenção de tarifas. Na prática, hoje todos os passivos acumulados com essas operações são pagas pelos clientes do rotativo, que representam entre 20 e 25 por cento do total. Em mercados mais maduros, o uso desse financiamento chega a ser 70 a 80 por cento do total. Claro, num ambiente de juros e impostos muito menores.

Governo e instituições do mercado concordam que, pelos níveis de juros praticados por aqui, limitar o prazo do uso do rotativo era inevitável. O presidente da própria associação do setor (Abecs), Marcelo Noronha, chegou a propor o fim do rotativo em meados do ano passado.

Mas os bancos reclamam que a mudança será feita de uma vez e de forma pontual. Eles temem, por exemplo, que a lógica de queda nos calotes não se comprove na prática com o teto para rotativo. Se tiverem restrições maiores para continuar usando o cartão, parte dos clientes no rotativo poderia ficar desestimulada a pagar as prestações.

"Não se sabe exatamente o que vai acontecer, porque o rotativo é uma linha cara, mas que todos sabem como funciona", diz uma representante da indústria, que também pediu para não ser identificado.

De fato, apesar dos juros dos cartões em máximas recordes, o rotativo foi uma das linhas que mais cresceram nos últimos dois anos. De dezembro de 2014 até novembro passado, o saldo do rotativo cresceu 38 por cento, segundo dados do Banco Central. Enquanto isso, o crédito consignado, modalidades considerada mais segura, subiu 27 por cento.

"De imediato, com a limitação do rotativo os bancos perdem. A questão é como eles vão reagir a isso", disse uma das fontes bancárias consultadas. "Hoje quem não paga tarifa, pode começar a pagar."

Por enquanto, em público, os bancos têm procurado manifestar boa vontade com as iniciativas do governo para fomentar a retomada da demanda interna, anunciando reduções de juros, como fizeram na véspera Banco do Brasil e Bradesco, também na esteira do corte da Selic.

Mas, pelo sim, pelo não, os bancos já se preparam para compensar eventuais pressões sobre as margens reduzindo a oferta de isenção de tarifas a clientes de maior relacionamento ou tomando a iniciativa de reduzir limites de crédito.

Por Aluísio Alves - *(O autor é repórter sênior do Serviço Brasileiro da Reuters. As opiniões expressas são do autor do texto)