ECONOMIA NACIONAL

Dólar não deve gerar pânico no Brasil, mas não estamos imunes

Efeito aqui será menor que na Argentina, mas há motivos para preocupação.

Em 16/05/2018 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

Enquanto Michel Temer celebrava os indicadores favoráveis de seus dois anos de governo num discurso maçante, o dólar batia em R$ 4 nas casas de câmbio. Sempre que o dólar muda de patamar, há certo pânico, sobretudo naqueles habituados a viajar ou fazer compras no exterior.

Como escrevi semana passada, a alta não provocará aqui o impacto desastroso que teve na Argentina, pois as reservas e o nível inflacionário guardam espaço maior para acomodação.

Mas isso não significa que o Brasil esteja imune ao choque externo. A dúvida é em que prazo e medida. O mercado vive a insegurança natural de uma véspera de eleição em que nenhum dos candidatos com plano econômico razoável emplaca nas pesquisas.

O mercado teme a volta do PT, a vitória de outro candidato de esquerda, como Ciro Gomes e Marina Silva, ou até mesmo de Jair Bolsonaro, ainda que ele conte com Paulo Guedes, um economista de extração liberal.

Não se sabe até que ponto Bolsonaro ouviria Guedes ou seus instintos nacionalistas do passado. Sua votação contra o cadastro positivo na Câmara – medida que deveria ser incontroversa para reduzir juros ao consumidor –, ao lado de PT, PSOL, PCdoB e quejandos, dá uma pista.

O risco é uma guinada populista que ponha em risco as reformas e o urgente ajuste fiscal. Se isso ocorrer, o Brasil estará diante de um abismo sem precedentes. Pela envergadura de nossa economia, a situação seria bem pior que a da Argentina. Na incerteza, todos tentam se proteger.

Mesmo que o melhor cenário se realize e tenhamos, a partir de 1º de janeiro, um governo economicamente alfabetizado, com planos sensatos de ajuste fiscal, reforma da Previdência, privatização e enxugamento do Estado, nossa sorte não estará garantida.

O motivo é o cenário internacional. Enquanto o PT, no governo, contou com abundância de capital e maré favorável no preço das commodities provocada pela demanda chinesa, agora o vento virou.

Nos Estados Unidos, a inflação deu sinal de vida, e alta nos juros deverá se acelerar. Mais que isso, a disputa comercial com a China iniciada pelo governo Donald Trump poderá provocar uma escalada de barreiras às importações mundo afora. O crescimento do mercado a produtos brasileiros estará prejudicado pela redução no comércio global.

Nosso maior potencial de crescimento está associado à abertura comercial, como revela um estudo da Secretaria de Assuntos Estratégicos lançado em março. Ele recomenda medidas que podem parecer contra-intuitivas, como a suspensão unilateral de tarifas, mas que certamente contribuiriam para o Brasil, segundo país mais fechado do mundo, voltar a crescer de modo sustentável.

Ainda que sejam adotadas, o país encontrará um mercado mais inóspito que nas décadas de 1990 e 2000, o auge da globalização até a crise de 2008. Se tivéssemos promovido abertura comercial quando ventos e marés eram favoráveis, em vez de insistir no nacional-desenvolvimentismo tacanho preconizado pelo PT e aplaudido por nosso empresariado dependente de prebendas estatais, o país seria outro.

Será tarde demais? Difícil dizer. Temos vantagens robustas em setores como agronegócio ou energia. Mas é evidente que áreas protegidas da indústria local – em especial o onipresente setor automotivo – usarão o cenário internacional para manter seus privilégios.

A principal lacuna do Brasil nas últimas décadas tem sido o desprezo pela educação e pela formação de mão-de-obra capaz de enfrentar os desafios de uma era regida pela robótica, inteligência artificial, genética e outros conhecimentos. Em comparação com o resto do mundo, somos antes de tudo um país burro. Por mais de um motivo.

(Foto: Fernanda Carvalho)