TEMAS GERAIS

Ela fugiu do Irã e protesta por liberdade de mulheres na Rio 2016.

Darya Safai pede fim de proibição baseada em gênero nos eventos esportivos do país.

Em 16/08/2016 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

"Deixem as mulheres iranianas entrar nos estádios". A mensagem erguida na faixa de Darya Safai nos jogos da seleção de vôlei do Irã é um apelo ao mundo. A ativista usa a Rio 2016 para dar luz à luta contra a proibição da entrada de mulheres nos eventos esportivos do país, onde há fortes restrições por gênero. Posicionada nas cadeiras centrais e mais próximas à quadra do Maracanãzinho, ela recebeu apoio de brasileiros nos duelos do Irã com Egito (último sábado) e Rússia (segunda-feira). Mas também houve vozes contrárias.

Enquanto mostrou a faixa, Safai disse ter sido intimidada por um compatriota defensor da revolução islâmica, ocorrida em 1979. Desde então, as mulheres passaram a ter restrições para frequentar eventos esportivos dos homens no país, sob o argumento de segurança e proteção ao comportamento obsceno entre os fãs do sexo masculino. As ressalvas, segundo Safai, eram eventos de basquete e vôlei, nos quais eram permitida a entrada há alguns anos, direito subitamente proibido.

– Ele ficou falando: "Leva essa mulher embora daqui". Sempre há alguém deles para intimidar as mulheres. Esse é um direito básico do ser humano: torcer pela sua seleção. O que aquele cara do Irã fez comigo é como eles tratam as mulheres lá todos os dias. Estou aqui para mostrar para as pessoas que nós, mulheres iranianas, estamos sendo punidas pelo crime básico de ser feliz. Dizem que a religião diz que as mulheres não podem fazer isso, aquilo, não podem se divorciar, ter a custódia de seus filhos. Isso é apartheid de gênero, discriminação, que é baseado em alguma coisa que eles estão Uusando para governar o país. Isso é uma ditadura religiosa, um regime de terror e por isso que eles estão tentando intimidar mulheres – afirmou.

Iranianos contra o protesto

 

Outros iranianos no Maracanãzinho discordaram do protesto de Safai. Eles alegaram que a mensagem da ativista tem cunho político e a Olimpíada não é o local certo para essa ação. No sábado, Safai foi às lágrimas por, segundo ela, ter sido cerceada por seguranças no que teriam chamado de um protesto político. Ela contestou, dizendo se tratar de um alerta sobre discriminação por gênero no país asiático.

Em contato com a reportagem, o diretor de comunicação da Rio 2016, Mário Andrada, no entanto, disse que foram os próprios iranianos que tentaram impedi-la e afirmou que a liminar que libera manifestações políticas na Olimpíada está sendo cumprida.

– Não tiramos a iraniana. Não eram pessoas nem da Rio 2016, nem da segurança. Não fomos nós, foram outros iranianos que queriam tirar. Quando a Rio 2016 viu falou que podiam ficar à vontade. Há uma liminar em vigor que autoriza protestos políticos pacíficos. De gênero a tendência é não autorizar, mas é difícil distinguir gênero e político. Se é por escrito, podemos pedir pra tirar. Um protesto de gênero falando para mulher ter liberdade é também político.

Na última segunda-feira, a reportagem viu Safai segurar sua faixa sem qualquer restrição durante todo jogo do Irã contra a Rússia. Depois da partida da seleção, o jogador Seyed não quis falar do assunto, e o atleta Milad Ebadipour disse que não via problemas na presença de mulheres do Irã nos estádios, apesar de também afirmar que se trata de uma questão política. As jornalistas iranianas que trabalhavam no local usavam um véu. Safai não.

– O esporte, e especialmente a Olimpíada, serve para juntar as pessoas. Esse é o espírito esportivo. E as mulheres no Irã não têm esse direito de aproveitar. Precisam viajar para fora do Irã para ver esportes. É o que estou mostrando e não misturando. O COI deveria ajudar as mulheres iranianas. Elas são as únicas excluídas de arenas esportivas. Qual é o dever do COI, da Federação Internacional de Vôlei e (FIVB) e da Fifa? Hoje estamos tentado ter nossos direitos de volta. O Irã deveria voltar a tratar as pessoas como pessoas. E mulheres iranianas são pessoas – disse a ativista.

O Irã

O Irã é uma república islâmica, com a maioria da população muçulmana e cerca de 90% deles são do ramo xiita. A religião é seguida de maneira rígida neste país da Ásia, que é governado pelo aiatolá Ali Khamenei, o líder supremo, desde 1989. Na área esportiva, por exemplo, as mulheres têm pouco espaço por lá. Dos 63 atletas da delegação do Irã na Olimpíada de 2016, 54 são homens. E Safai explica que a concentração de poder nas mãos de um mesmo líder que controla os iranianos há anos causa opressão e restrições, principalmente para o sexo feminino.

- Nossa mensagem é sobre igualdade, a maioria das pessoas do Irã apoia a igualdade, eles sabem que eles não podem respirar, não podem fazer nada, não podem sair de casa, não podem fazer festa, beber álcool, ir pra praia, não podem viver. Os direitos das mulheres é uma mensagem positiva. A lei não fala que mulheres não podem entrar nos estádios, mas há os poderes opressores, guardas do Khamenei, o líder supremo, ditador religioso, o poder dele é acima da lei. Se ele diz não é não. Eles falam porque as mulheres não devem ver as pernas dos homens. Eles impõem. Há alguns anos prenderam mulheres que queriam ir aos estádios para ver jogos - explicou Darya

Prisão e apoio de peso

Safai relata ter sido presa por alguns dias em 1999 por defender os direitos humanos das mulheres em protestos. Antes do julgamento que definiria quanto tempo ficaria na cadeia, fugiu da capitã Teerã para a Bélgica, onde vive e é ativista até hoje. Desde 2014 roda eventos esportivos pelo mundo com o protesto a favor das mulheres iranianas.

No Rio, a campanha ganhou apoio da dupla brasileira semifinalista no vôlei de praia, Ágatha e Bárbara. As duas aparecem em fotos com Safai no Facebook segurando a camisa com a mensagem pelo fim da proibição das iranianas nos estádios.

Com o apoio de atletas e torcedores, ela quer usar a Rio 2016 para mudar a situação no Irã. Antes de retornar para a Bélgica, voltará ao Maracanãzinho nesta quarta-feira para, uma vez mais, levar sua mensagem de liberdade para as mulheres iranianas nos estádios, durante o duelo da seleção do seu país com a Itália, pelas quartas de final.

– Espero que sim. Acho que se nos mantivermos com esperança... Você sabe há quanto tempo  estou fazendo isso? E agora estamos em todo o mundo. Se você não fizer nada, nada vai acontecer. Eu acredito na mudança dessa situação.

Fonte: GE