TEMAS GERAIS

Empresas gaúchas apostam em produtos sem gênero

Roupas não são destinados a homens ou mulheres, mas sim a qualquer pessoa.

Em 19/08/2017 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

A empresa trabalha com um mix de cerca de 200 produtos que variam entre bodies, tapa fraldas, camisetas e calças para crianças de até dois anos. Para o sócio, o e-commerce, que são as vendas pelo site da própria marca, possibilitou que mais pessoas que se identificam com a proposta da empresa possam adquirir os produtos.

"Atingimos um público mais consciente com as questões de consumo, que quer saber o que está vestindo e o que está apoiando através das marcas que consome. Para nós isso é superbom, porque conseguimos chegar mais rápido que imaginávamos em um bom patamar", garante.

Mas nem só empresas novas no mercado resolveram investir nesse tipo de produto. A Melissa, que pertence ao grupo Grendene e foi lançada em 1979 em Farroupilha, na Serra do Rio Grande do Sul, também criou uma linha de calçados com numeração estendida, para que homens pudessem usá-los.

"Há algum tempo que temos uma demanda de homens para usar Melissa e não tínhamos numeração masculina dos nossos produtos. Então, há uns dois ou três anos, tivemos essa ideia ao entender que a moda está transcendo essa questão de gênero", afirma o diretor-executivo da empresa, Paulo Pedó.

Os produtos da Melissa que mais são vendidos para homens, segundo Pedó, são os flox e as sandálias de cores neutras, como preto, branco, nude e marrom. No entendimento do diretor-executivo da empresa, essa preocupação se deve a percepção de que o gênero não define a pessoa e muito menos os seus gostos.

"Foi uma atitude nossa muito positiva. Até porque a gente vê muitas mulheres comprarem produtos para elas e para os namorados. Se no passado existia um certo preconceito com isso, hoje foi superado", salienta.

A professora Jane Felipe discorda. Ela lamenta o fato de a sociedade brasileira ainda ser tão conservadora a ponto de não permitir moralmente que um indivíduo experimente algo atribuído a outro gênero.

"Se você pegar outros países é diferente. Em outras culturas pode ser diferente. Saias, batas, em muitos lugares homens usam normalmente", exemplifica.

A professora do curso de Moda da Unisinos Paula Visoná, especialista em comportamento do consumidor, lembra que até mesmo a calça quando começou a ser utilizada era um artigo exclusivamente de homens e, com o passar do tempo, foi incorporada ao vestuário feminino de forma natural.

"Essa discussão de moda e gênero não é algo de agora, mas nesse momento voltou à pauta. Num primeiro momento tem muita gente falando sobre isso, mas acredito que vai chegar um momento, não tão logo, que não será algo tão passível de discussão, que vai ser incorporado e homens vão voltar a usar saia naturalmente", pontua.

Outro exemplo é a também gaúcha Xalingo, que há 70 anos produz brinquedos e, desde 2004, passou a se preocupar em não conservar estereótipos, como ser engenheiro é coisa de menino e brincar de cozinha é coisa de menina.

"A gente recebia muitas solicitações de mães pedindo que os produtos fossem unissex. Muitos meninos gostam de brincar de casinha, de cozinha. Fomos amadurecendo a ideia e resolvemos trazer esses produtos mais neutros, sem detalhes ou cores que remetam a um gênero específico", recorda a gerente de marketing da empresa, Tamára Campos.

Outra alteração que vem sendo feita em toda a linha de produtos da marca se refere às embalagens, que em sua maioria trazem um menino e uma menina, sem estimular mais um ou outro gênero a usar aquele brinquedo. De acordo com Tamára, hoje 10% do faturamento da empresa, que foi de R$ 110 milhões em 2016, é proveniente da linha sem distinção de gênero.

"As indústrias têm que acompanhar o desenvolvimento da sociedade. Não existe profissão masculina ou feminina. As pessoas ainda confundem muito isso na hora de escolher brinquedo, mas na verdade eles servem é para estimular a criatividade das crianças e não definir suas preferências sexuais", elucida.

Ainda que as marcas e a sociedade discutam cada vez mais o tema, a avaliação de quem convive com esse debate diariamente é de que as aceitações culturais não serão assim tão rápidas.

"Precisamos de uma formação docente que dê conta e discuta os direitos humanos, que envolvem gênero e sexualidade, nas escolas. Só assim poderemos superar essa onda conservadora que existe no Brasil", conclui a especialista Jane Felipe.

(Foto: Fagner Damasceno/Sueka/Divulgação)