MEIO AMBIENTE

Lama aumenta em 20 vezes o nível de ferro no mar do ES, diz estudo.

Houve diminuição de 60% em diversidade de base da cadeia alimentar.

Em 15/03/2016 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

A chegada da lama do Rio Doce no mar do Espírito Santo fez com que a concentração de ferro no oceano ficasse, em uma primeira análise, 20 vezes maior que antes da tragédia. Além disso, houve a redução de quase 60% na diversidade de espécies que fazem parte da base da cadeia alimentar, por causa da lama que ficou no fundo do mar.

Esses são dois graves problemas apresentados em um estudo parcial sobre os impactos da lama do Rio Doce na água do mar divulgado pela Universidade Federal do Espírito Santo, ao G1, nesta terça-feira (15).

Atualmente, em uma análise recente, segundo o geólogo Alex Bastos, que coordena o grupo de estudos, o nível de metais diminuiu porque a lama foi para o fundo do mar. Mas, uma tempestade ou qualquer movimento no oceano, podem fazer com que a lama volte para a superfície, e a concentração de metais volte a aumentar.

Bastos ainda alerta que o problema da lama vai por existir muito tempo, porque o volume que saiu da barragem ainda está na calha do rio e vai continuar sendo jogado no mar. "A gente tem que pensar que essa lama que entrou no Rio Doce mudou o rio e ela vai continuar sendo aportada para a plataforma. O lugar de escape da lama é o mar. O rio antes tinha um nível, e esse nível mudou. Isso altera o ecossistema como um todo", afirmou.

Tragédia
A Samarco, cujos controladores são a Vale e a anglo-australiana BHP, é a responsável pela barragem que se rompeu em Mariana (MG) no fim do ano passado e deixou mortos e desabrigados. A lama gerada pelo rompimento atravessou o Rio Doce e chegou ao mar do Espírito Santo. No percurso do rio, cidades tiveram de cortar o abastecimento de água para a população em razão dos dejetos além de uma série de problemas.

Estudos
Professores, pesquisadores e alunos da Ufes coletaram amostras na foz do Rio Doce, em Regência, para estudar os impactos da lama na região. Embora esses estudos tenham se intensificado após a tragédia ambiental, professores já pesquisavam há cerca de 4 anos a pluma (lama), que é natural nos rios.

Para Bastos, esses estudos anteriores permitiram realizar comparações e identificar com mais precisão o impacto no ecossistema do mar.

Nesta análise, os pesquisadores contaram com amostras coletadas de forma independente pela Ufes e com o apoio do Navio da Marinha Vital de Oliveira.

O professor explica que não teve acesso aos estudos realizados pelos pesquisadores da Marinha, entregues ao Instituto Estadual de Meio Ambiente (Iema) e que o navio foi usado para realizar a coleta para a pesquisa na universidade, entre os dias 25 e 29 de novembro, e 1 e 4 de dezembro.

Foram analisadas a presença de metais, sedimentos e organismos que vivem na água.

Concentração de metais
A primeira constatação da pesquisa foi a presença de altos índices dos metais: ferro, alumínio, manganês e cromo.

Segundo Bastos, após a chegada lama a concentração de ferro no fundo do oceano, perto da foz, era 20 vezes maior que antes da tragédia. Já o Alumínio era 10 vezes maior, e Cromo e Manganês 5.

A concentração diminui com o tempo, mas ainda assim continua superior ao valor que normalmente se encontrava no rio. Apesar de não se identificar a alta presença dos metais na superfície, todo esse material está agora no fundo do mar.

"Os teores têm que cair porque houve um aumento do rio, não vem mais aquele volume do material de lama que vinha antes. Então, a tendência do teor é diminuir, mas isso não significa um bom resultado, porque ele vai continuar constante, em valores mais elevados que o background natural. Esse material diminuiu na coluna d'água, mas ele foi pro fundo", explicou.

Nas imagens abaixo, é possível ver a diferença entre a lama que é natural do fundo do oceano (mais escura) e a que veio com os rejeitos de minério da Samarco (marrom mais claro).

Diversidade das espécies
Uma outra constatação do estudo realizado na foz do Rio Doce é a redução de quase 60% na diversidade de espécies do fitoplâncton, que são microalgas que formam a base da cadeia alimentar no mar.

"A gente observou que os níveis de clorofila estavam quatro, cinco vezes superior ao valor normal. Então essa entrada de ferro no sistema fez com que a gente tivesse um grande boom de algas. Fez aumentar a produção de clorofila, do fitoplâncton. Mas o que chamou mais a atenção é que a diversidade diminuiu", disse o professor Alex Bastos.

Nos dados anteriores ao acidente, existiam pelo menos 60 espécies de algas e nesse levantamento em novembro, depois da lama, foram vistas 25 espécies.

Por se tratar da base da cadeia alimentar, os pesquisadores ainda não sabem dizer com precisão o que isso pode causar na alimentação dos seres marinhos. " Aumentou a produção de fitoplâncton, você pode pensar, é uma coisa boa. Mas a diversidade diminuiu. É aquela coisa: você só come carne, se para de ter carne e só tem alface, muda a sua dieta", afirmou.

Isso acontece porque a lama em suspensão e que ainda está na calha do rio continua se depositando no fundo do mar.

A principal consequência seria para organismos bentônicos, que são pequenos seres vivos que vivem no ambiente marinho. Entre eles, pequenos crustáceos, esponjas, poliquetas e moluscos (foto). Esses seres estão recebendo mais sedimentos do que estavam acostumados, que podem levar a algum tipo de soterramento.

"Uma outra consequência é a própria característica da lama. Essa lama que a gente viu é um material um pouco mais fino do que o depositado anteriormente, com um alto teor de metais. O quanto isso vai impactar é uma análise crônica que deve ser feita nos próximos anos. O impacto já foi observado devido essa alta taxa de sedimentação que a gente viu na foz do Rio Doce", completou Bastos.

Fonte: G1