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Os sete erros no transporte de rochas na BR-101

Foram 34 vidas perdidas em 2017 em duas tragédias.

Em 18/09/2017 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

Foram 34 vidas perdidas em 2017 em duas tragédias protagonizadas por veículos que transportavam rochas ornamentais na BR-101, e os fatos apontam para uma direção: além do impasse quanto à infraestrutura, há diversas imprudências e falhas de fiscalização na estrada federal no Espírito Santo.

Neste domingo (17), em que o acidente que matou 11 pessoas em Mimoso do Sul completa uma semana, o G1 listou sete erros que colocam vidas em risco na estrada.

1. Desrespeito às regras de transporte

A regulamentação do transporte de rochas é forte, mas nem sempre é respeitada. Em entrevista ao Bom Dia ES, o presidente do Sindirochas, Tales Machado, explicou que as chapas ou blocos não podem se soltar do veículo. Dessa maneira, os motoristas ficam mais atentos na estrada porque se a carga cair, o veículo tomba, aumentando o risco para eles próprios.

Duas integrantes do grupo de dança alemã Bergfreunde, Nathália Herbst e Maria Letícia Ferreira da Silva, que sobreviveram ao grave acidente na BR-101 no Sul do Espírito Santo no dia 10 de setembro, disseram que o que matou os amigos foram as chapas de granito que se soltaram e atingiram o micro-ônibus que pegou fogo.

Segundo o presidente do Sindirochas, a inspeção veicular anual exigida para quem transporta blocos não é exigida para quem transporta chapas. Ele fala que o Detran só exige se o motorista falar que ele vai transportar chapa, ficando a fiscalização à mercê da honestidade de quem transporta.

O gerente operacional do Detran-ES, Cleber Bongestab, disse que no ano de 2016 foram registrados 1.082 laudos de inspeção em uma Instituição Técnica Licenciada (ITL), credenciada pelo Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), referentes a veículos adaptados para transporte de blocos de pedra ornamentais e chapas serradas. Neste ano, há registro de 675 laudos do tipo.

O Detran informou também que publicou a Instrução de Serviço Nº 1260, em junho de 2011, que exige dos veículos adaptados para transporte de blocos de pedra ornamentais e chapas serradas a apresentação do Certificado de Avaliação Técnica emitido por Instituição Técnica Licenciada (ITL).

Resolução 354

A resolução 354/2010 do Conatran estabelece requisitos de segurança para o transporte de blocos e chapas serradas de rochas ornamentais.

  • detalha o tipo de amarração a ser usada para o transporte de blocos de rochas e chapas serradas, e o transporte de rochas em caçambas
  • estabelece o peso máximo da carga de rochas de acordo com o tipo de veículo
  • diz que veículos que exigem amarração específica para o transporte de rochas deverão comprovar a realização de inspeção anual

2. Imprudência dos motoristas na estrada

Os dois caminhões que transportavam rochas envolvidos nas tragédias de Mimoso do Sul e de Guarapari tinham mais de 20 multas.

Na tragédia de Mimoso do Sul, a carreta que transportava chapas de granito tinha 24 autuações. O motorista que dirigia o veículo também tinha registradas 11 infrações na carteira, segundo a Polícia Rodoviária Federal. O tacógrafo do veículo indicou que o motorista dirigia acima da velocidade permitida no momento do acidente.

Segundo a Polícia Rodoviária Federal, a carreta envolvida na tragédia em Guarapari, que transportava um bloco de granito, tinha 26 multas. O veículo também já havia sofrido outros quatro acidentes desde 2006, dois tombamentos e duas batidas de frente.

Laudos toxicológicos apontaram, ainda, o uso de cocaína e rebite pelo motorista no caso de Guarapari. Uma reportagem feita pela TV Gazeta mostra que o uso desse tipo de substância é comum no transporte de cargas.

As ultrapassagens proibidas são infrações frequentes nas estradas. Um vídeo feito do dia 1º de setembro mostra uma ultrapassagem feita numa curva no mesmo trecho onde aconteceu o acidente em Mimoso do Sul.

3. Rodovia não duplicada

Em entrevista ao Bom Dia ES, o inspetor Macedo Miranda, da Polícia Rodoviária Federal, afirmou que a BR-101, se duplicada, evitaria acidentes, principalmente os de colisão frontal. Mas o inspetor alerta para o fato de que a duplicação é uma medida de longo prazo.

Enquanto vidas são perdidas na estrada, a duplicação da rodovia ainda é incerta. Embora o contrato de concessão à Eco 101 determine que esse serviço seja feito, a concessionária chegou a afirmar que não o faria.

No entanto, nesta quinta-feira (14), uma reunião entre a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e a Eco 101 fez com que as duas partes chegassem a um acordo, e as obras em cinco cidades do estado, previstas para 2017 e 2018, vão continuar.

Uma proposta feita pela concessionária, que faz parte da revisão quinquenal do contrato, está sendo analisada pela ANTT.

4. Veículos inadequados

A Polícia Rodoviária Federal (PRF) disse, na ocasião da tragédia, que a carreta envolvida no acidente em Guarapari transportava uma carga além do peso permitido e estava com pneus carecas.

O delegado Alberto Roque Perez disse que o veículo estava em condições inadequadas para rodagens.

5. Número de policiais rodoviários abaixo do ideal

A Polícia Rodoviária Federal (PRF) no estado trabalha com efetivo abaixo do ideal. Mesmo com o efetivo insuficiente, o inspetor Macedo Miranda, da PRF, afirma que os números apontam que há êxito no serviço realizado.

“Nós temos conseguido cumprir a nossa missão com o esforço maior de quem está trabalhando”, disse Macedo, em entrevista ao Bom Dia ES.

Nem todos os transportadores de carga são alvo da PRF, que faz a fiscalização por amostragem. Outros, ainda, encontram maneiras de evitar a polícia. “Eles usam artimanhas para burlar a fiscalização. Usam desvios, lonas para disfarçar”.

6. Saída do produto sem pesagem

Em entrevista à rádio CBN Vitória, o representante do Sindirochas, Tales Machado, afirmou que a pesagem das rochas é feita por estimativa, com margem de erro de 10% a 15% do peso, e que a medida exata só pode ser medida em balanças nas rodovias.

"Lá na pedreira você tira as medidas do bloco e faz uma estimativa. Para ter certeza, só levando o carro na balança. A Polícia Rodoviária Federal faz isso: uma fiscalização por amostragem. Os casos que ela pega com perspectiva de excesso, ela leva para a balança. Agora, existe muito excesso", explicou.

7. Balanças que não funcionam 24 h

Atualmente, no trecho da rodovia no Espírito Santo, a ANTT opera balanças de pesagem veicular em Linhares, na Serra e em Rio Novo do Sul. No entanto, elas não funcionam durante 24 horas.

Em Viana também há uma balança, que não está em funcionamento porque as obras foram suspensas a pedido da Comissão de Externa de Fiscalização da BR-101 na Câmara dos Deputados.

O inspetor Macedo Miranda disse que uma maneira de garantir que todos os veículos de carga sejam pesados seria o funcionamento ininterrupto das balanças.

“Seria uma colaboração muito grande para a Polícia Rodoviária Federal porque haveria outro tipo de pesagem, a gente não precisaria parar os veículos para pesar, eles já seriam pesados automaticamente”, afirmou.

A ANTT informou que a BR-101 no estado vai ter duas balanças móveis. Os técnicos da ANTT, da PRF e da Eco 101 vão definir os locais mais adequados para a instalação.

Caminho para soluções

Para tentar amenizar os problemas causados por esses erros, é primordial unir os envolvidos nesse processo de produção, transporte e fiscalização.

O Ministério Público do Espírito Santo (MP-ES) anunciou, nesta quarta-feira (13), que um grupo de trabalho para discutir a questão da fiscalização, educação e regulamentação do setor de rochas está sendo montado.

Uma das propostas do MP-ES é o uso de ferramentas de georeferenciamento para o controle do transporte nas rodovias, desde a saída do veículo da pedreira até o destino final.

“Só a Polícia Rodoviária Federal não resolve. Isso está claro. Eles fazem uma parte, mas não conseguem fazer tudo. Eu não quero colocar culpa em transportador. É de todos nós. A gente tem que que trabalhar e evoluir”, disse o presidente do Sindirochas, Tales Machado, em entrevista à TV Gazeta.

O superintendente do Sindicares, Mario Natali, aponta para maior fiscalização na saída dos blocos das pedreiras.

“Toda essa cadeia tem que ser discutida para que não fique na mão de só um ator. Se nós combatermos a origem, desde a extração, desde o embarque, nós não teremos efetivamente esse problema nas nossas estradas”, disse.

(Foto: Ari Melo/ TV Gazeta)