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PGR pede federalização de investigações sobre greve de PMES

O órgão acredita que o estado não tem capacidade para apurar os fatos.

Em 29/07/2017 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) a federalização das investigações sobre greve de policiais militares do Espírito Santo. O pedido aconteceu na quinta-feira (27).

O órgão acredita que o estado não tem capacidade para apurar os fatos porque, segundo o documento, “há o risco de parcialidade no prosseguimento da investigação e na penalização dos responsáveis”.

O estado viveu a pior crise na segurança da história, no mês de fevereiro de 2017, depois que um movimento formado por esposas, amigos e parentes de policiais militares fechou as entradas das unidades de polícia, exigindo melhorias nos salários dos policiais, entre outros pedidos. Sem os PMs nas ruas, houve uma série de crimes e mais de 200 mortes violentas foram registradas. A Força Nacional e as Forças Armadas precisaram atuar no Espírito Santo.

Durante mais de 20 dias sem a Polícia Militar, houve um prejuízo superior a R$ 180 milhões de danos sofridos por lojistas, empresários e residentes no estado, além do custo aos cofres federais da atuação das Forças Nacionais de cerca de R$ 37,5 milhões.

No pedido, o procurador-geral destaca que “a sociedade capixaba ficou absolutamente exposta à criminalidade”.

A federalização vai “garantir a responsabilização criminal dos policiais militares, também e em especial daqueles que teriam condições e força, por sua posição hierárquica na corporação, para fazer cessar o movimento de paralisação, mas foram omissos ou incitaram os demais à paralisação”, segundo Janot.

Requisitos

O procurador-geral aponta que o caso apresenta os três requisitos necessários para o deslocamento de competência:

  • A constatação de grave violação de direitos humanos;
  • A possibilidade de responsabilização internacional, decorrente do descumprimento de obrigações assumidas em tratados internacionais;
  • E a evidência de que os órgãos do sistema estadual não mostram condições de seguir no desempenho da função de apuração, processamento e julgamento do caso.

Segundo a PGR, os fatos evidenciam contexto de “gravíssima violação de direitos humanos, vislumbrada nos efeitos advindos da conduta dos policiais militares do Estado do Espírito Santo, atingindo o direito à vida e à segurança da sociedade capixaba, e na própria falência do Estado em seu dever de assegurá-los, especialmente no que se refere a uma investigação efetiva e isenta, por órgãos aos quais se assegure independência”.

Responsabilização internacional

O pedido chama a atenção para a possibilidade de responsabilização internacional por descumprimento de obrigações assumidas em tratados internacionais.

“Aos olhos da comunidade internacional, o Poder Público falhou em seu dever de proteção social. Há, no caso em exame, falência do Estado na prestação de segurança pública, com gravíssimos reflexos sobre a vida e a dignidade da pessoa humana, o que pode acarretar a intervenção da comunidade internacional”, aponta Janot.

Incapacidade de apuração estadual

O PGR entende que “há o risco de parcialidade no prosseguimento da investigação e na penalização dos responsáveis pelos atos praticados – em especial da camada hierarquicamente superior da PM –, que agridem diretamente o Estado democrático e a sociedade civil local”.

Segundo Janot, em cenário conturbado como o que viveu o Estado do Espírito Santo, o julgamento de crimes militares por seus próprios pares mostra-se “irrazoável e temerário, em razão da extensão do movimento de paralisação dos PMs capixabas, com adesão de praticamente 100% de seu efetivo, e dos indícios de participação de oficiais de patentes altas na organização do movimento”.

“A proximidade dos oficiais da Polícia Militar com os diversos níveis de autoridades, e a dependência, em parte, do Judiciário, do Executivo e do Legislativo da estrutura policial é fator de elevado risco”, comenta.

No pedido de federalização, o procurador-geral pede que o caso seja transferido para a Justiça Militar da União, em razão das peculiaridades da matéria.

Para o PGR, se no âmbito estadual o tema é tratado pela Justiça Militar Estadual, a transferência para a esfera federal deve levar o caso para a Justiça Militar da União, “de forma a garantir a manutenção da análise especializada”.

Caso esse pedido não seja acolhido pelo STJ, Janot pede que, alternativamente, o caso seja transferido para a Justiça Federal comum.

Ministério Público do ES

No documento enviado pela PGR, o Ministério Público do Espírito Santo se manifestou dizendo que é “prematuro o deslocamento da apuração para o âmbito federal”.

A despeito disso, segundo o mesmo documento, “há nos autos a demanda de promotor de justiça de auditoria militar no sentido de federalizar o caso, diante da proporção que a situação tomou, inviabilizando a formação de conselhos de justiça (permanente e especial) para julgar tais situações”.

Governo do Espírito Santo

O G1 solicitou ao governo um posicionamento sobre o pedido da PGR, mas não houve retorno até a publicação desta reportagem.

Cronologia da crise

  • Início do protesto - No dia 3 de fevereiro, um grupo de mulheres e filhas de Policiais Militares fechou um destacamento na Serra. No dia 4, o protesto se espalhou em outros municípios.
  • Onda de crimes - No dia 6 de fevereiro, videos de arrombamentos e saques de várias cidades circularam nas redes sociais. A Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos recebeu mais de 200 pessoas em um dia. O DML ficou superlotado e 62 mortes foram registradas em apenas três dias.
  • Troca do comando da PM - No dia 6 de fevereiro, ocoronel Nylton Rodrigues assumiu o comando da PM.
  • Exército nas ruas - No mesmo dia, a pedido do governo, homens das Forças Armadas e Nacional começaram a atuar no estado.
  • Comando da PM abre inquéritos - No dia 10 de fevereiro, o comando da PM abriu os procedimentos para punir 300 policiais. As investigações apontaram que houve motim ou revolta, o que é crime.
  • PMs começam a se apresentar nas ruas - No dia 11 de fevereiro, alguns policiais militares começaram a se apresentar nas ruas de Vitória.
  • Mulheres desistem de reajuste em carta - No dia 13 de fevereiro, o movimento passou a cobrar melhorias para os policiais.
  • Justiça ordena saída das mulheres - No dia 14 de fevereiro, uma multa de R$ 10 mil foi estipulada para 10 mulheres caso não deixassem a porta dos batalhões.
  • Governo rejeita nova proposta do movimento - No dia 20 de fevereiro, a Associação dos Oficiais Militares do Espírito Santo, representando as mulheres do movimento, protocolou uma nova proposta de acordo.
  • Quase 30% dos PMs da ativa são processados - Com o anúncio da abertura de novos 1.549 processos, o número de policiais militares que respondem inquéritos internos chegou a 2.851, 28% da corporação.
  • Efetivo da PM é normalizado em 23 cidades - No dia 22 de fevereiro, 23 cidades já estavam com o policiamento, mas 71% seguiam sem o número total de policiais. Os 3.450 militares das Forças Armadas continuavam nas ruas.
  • Mulheres têm reunião mediada pelo MPT - No dia 24 de fevereiro, movimento, governo e Ministério Público do Trabalho se reúnem.
  • FIM DO PROTESTO - A reunião mediada pelo MPT, iniciada na noite anterior, durou nove horas e terminou em consenso entre mulheres e governo.

(Foto: Fernando Madeira/ A Gazeta)