CIÊNCIA & TECNOLOGIA

Nós somos a inteligência artificial, diz antropóloga Mary Gray

Mary diz que o futuro do trabalho só pode ser pensado a partir das pessoas que trabalham.

Em 06/05/2019 Referência JCC, Rafael Grohmann

Foto: Istoé Dinheiro/Reprodução

Mary Gray, pesquisadora do Berkman Klein Center da Universidade de Harvard e da Microsoft Research, lançará na terça-feira 7 o livro Ghost Work: how to Stop Silicon Valley from Building a new Global Underclass (Trabalho Fantasma: como Fazer o Vale do Silício parar de Construir uma Nova Subclasse Global, em tradução livre).

Escrito em coautoria com o cientista da computação Siddhart Suri, a obra mostra os trabalhadores invisíveis que ajudam a construir plataformas digitais como Amazon e Google e boa parte da chamada Inteligência Artificial. A seguir, trechos de sua entrevista..

O que é o trabalho fantasma?

Qualquer trabalho que pode ser, ao menos em parte, agendado, gerenciado e construído por meio de interface de programação de aplicativos (API), com um brilho de Inteligência Artificial.

Como isso ocorre?

O que é fascinante sobre Inteligência Artificial e o seu uso no sistema produtivo é o fato de que nós somos a Inteligência Artificial. Por exemplo, o revisor gramatical em um processador de texto. Ele tenta antecipar quais palavras você está tentando escrever. Foram dezenas de milhares de pessoas, ao longo de muitos anos, para que os softwares pudessem ser capazes de entregar um sistema que funcione.

The cleaners: documentário mostra rotina de trabalhadores encarregados de eliminar das redes sociais cenas de violência, como assassinatos (Crédito:Divulgação )

Mas isso é algo positivo, não?

Isso é muito bom! A maioria dos revisores ortográficos pode capturar tudo. E a mesma infraestrutura produz softwares de reconhecimento de voz. Mas todos esses aparatos têm pessoas por trás preparando ou treinando os softwares. Isso requer muitas pessoas ao longo dos tempos.

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É um paradoxo da automação. 

Sim, mas, ao longo do tempo, os desenvolvedores do software perceberam que poderiam arrastar pessoas para um loop infinito de serviços, de modo que a pessoa não esteja lá somente para treinar os dados.

Mas nem sempre é possível estar atento a um serviço ou produto com esse trabalhador invisível por trás.

Cabe aos consumidores questionarem, quando estão comprando um produto muito barato ou grátis, quais são as condições de trabalho por trás dele.

E em que situação o aprendizado de máquina seria menos provável de ser aprendido com os humanos?

Imagine que você está cuidando de um ente querido: tente descobrir qual a vontade dele, se ele precisa de um cobertor, de um copo d’água ou apenas que você segure sua mão. Podemos até prever um pequeno conjunto de coisas que alguém poderia querer, mas as capacidades humanas de antecipar e atender a necessidade de outra pessoa é o que torna os sistemas distintos. Não importa quantos exemplos anteriores você tem para treinar um modelo (máquina, software): em algum momento as pessoas estarão sempre mais adaptadas para saber o que uma pessoa amada quer. E também terá a capacidade da empatia.

Há também a questão regulatória…

É preciso confrontar a regulamentação. De muitas maneiras, a economia mundial não tem girado a partir do emprego formal. Na Índia, a maioria das pessoas ganha seu dinheiro dia a dia, semana a semana, não sabendo quando receberá seu próximo pagamento. Precisamos criar capacidades para reconhecer a contribuição de cada um.

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