POLÍTICA NACIONAL

Governadores aprovam Carta de reivindicações ao Planalto

Diante da grave crise política e do Covid-19, governadores se unem e apertam Planalto.

Em 25/03/2020 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

Foto: Derick Nunes - Secom/ES

O dia de hoje (25), foi marcado por muitas reuniões por videoconferência, envolvendo o presidente da República Federativa do Brasil, Jair Messias Bolsonaro, e os governadores dos Estados da Federação do Brasil, o que resultou, em resumo, na elaboração de uma CARTA DOS GOVERNADORES DO BRASIL NESTE MOMENTO DE GRAVE CRISE.

O presidente Jair Bolsonaro ficou ainda mais isolado dos governadores nesta quarta-feira, após entrar em atrito direto com o governador de São Paulo, João Doria, durante reunião sobre o coronavírus, e de perder o apoio do governador de Goiás, Ronaldo Caiado, devido ao pronunciamento no qual voltou a minimizar a pandemia e criticou medidas dos Estados.

Durante reunião de Bolsonaro com governadores da Região Sudeste, Doria disse lamentar o pronunciamento do presidente na véspera e cobrou diretamente que ele lidere o país com serenidade em meio à crise gerada pelo coronavírus, de acordo com pessoas com conhecimento do encontro.

Bolsonaro respondeu de forma dura —uma reação que Doria chamou em uma rede social de “ataque descontrolado”— e afirmou que o governador paulista elegeu-se em 2018 usando seu nome, além de afirmar que o tucano atuava politicamente com vistas a uma candidatura à Presidência na eleição de 2022. Nas palavras de uma fonte que teve acesso ao encontro, Bolsonaro “partiu para o MMA”.

Os pedidos de Doria

Durante a reunião, Doria pediu a suspensão por um ano do pagamento das dívidas dos Estados com a União, a suspensão do pagamento das dívidas com a União por 12 meses e defendeu ainda que o governo federal atue junto ao Banco Mundial e ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) pela suspensão, também por um ano, do pagamento das dívidas dos Estados com esses organismos multilaterais de crédito.

O tucano também pediu que portos e aeroportos sigam abertos para permitir a importação de insumos, a antecipação do pagamento de parcelas da Lei Kandir aos Estados e a alertou que o governo paulista tomará medidas judiciais caso o Ministério da Saúde atue para confiscar equipamentos médicos, como respiradores, adquiridos por São Paulo.

Um dos governadores mais próximos de Bolsonaro até o início da crise do coronavírus, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, que é médico e próximo do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, criticou duramente o pronunciamento feito na véspera por Bolsonaro e disse que eventuais medidas do governo federal para reduzir o isolamento social durante a pandemia não terão efeitos em seu Estado.

“É inadmissível o presidente tratar pandemia que já matou quase 20 mil pessoas em todo o mundo, como ‘resfriadinho’. Insensibilidade que fere familiares de vítimas. Sou médico e não aceito isso”, disse Caiado no Twitter.

Colapso econômico

“Buscar a tese de que teremos colapso econômico de grandes proporções, é querer colocar na balança o que é mais importante: a vida humana ou a sobrevivência da economia. E isso não tem discussão. Garantir a saúde, a segurança alimentar e física dos goianos é minha responsabilidade”, acrescentou.

O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, que assim como Doria vinha sendo criticado por Bolsonaro pelas medidas de restrição, disse que o pronunciamento do presidente, no qual defendeu a reabertura de escolas e a volta das pessoas ao trabalho, não tem valor jurídico, indicando que manterá as restrições adotadas no Estado.

“O pronunciamento não tem validade jurídica. É uma opinião política... se cada empresário atender ao pronunciamento, juntamente com que o fez (Bolsonaro), pode ser responsabilizado por suas ações lá na frente”, alertou.

O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, participou, da reunião e falou sobre o enfrentamento ao novo Coronavírus (Covid-19) nas áreas de saúde e econômica. Em sua fala, Casagrande pediu a união dos entes federados sob a liderança do Governo Federal.

“Temos seguido a Organização Mundial da Saúde (OMS) e na hora que o presidente opina e tira o valor da pandemia, causa confusão e dúvida nas pessoas, dificultando nossa ação. É muito bom que a gente possa ter essa reunião para que o Governo Federal assuma a responsabilidade e, juntos, diminuamos o impacto social, econômico e na saúde”, pontuou o governador capixaba.

“Atitude errática”

Em entrevista coletiva no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista, após a videoconferência com o presidente, Doria voltou a criticar a postura de Bolsonaro e a pedir que ele lidere com “serenidade” o país durante a pandemia. Anunciou ainda que os 27 governadores se reunirão na tarde desta quarta em videoconferência para discutir a crise e o que chamou de atitude “errática” de Bolsonaro.

“Hoje às 16h os 27 governadores do Brasil estarão reunidos virtualmente numa conferência de duas horas de duração —das quatro às seis da tarde— dada a gravidade das circunstâncias do país e do comportamento do presidente da República”, disse Doria.

Inicialmente Bolsonaro faria um pronunciamento após a videoconferência com os governadores da Região Sudeste, mas a fala do presidente foi cancelada.

Além do atrito com os governadores, Bolsonaro também foi criticado pela Frente Nacional dos Prefeitos (FPA) por causa do pronunciamento da noite de terça-feira. Em nota, a entidade disse que os prefeitos “repudiam” as declarações do presidente e pediram esclarecimentos ao Ministério da Saúde. L1N2BI1OE

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), a Covid-19, doença provocado pelo coronavírus, já infectou mais de 375 mil pessoas em 195 países e matou mais de 16 mil. No Brasil, de acordo com números do Ministério da Saúde, o número de casos passa dos 2 mil, e 46 pessoas morreram.

À tarde, a Reunião dos Governadores

Reunidos em videoconferência, 26 dos 27 governadores também aprovaram pedido de suspensão por 12 meses do pagamento das dívidas dos estados, além de outras reivindicações.

Os Governadores aprovaram uma carta com uma série de reivindicações ao governo federal para fazer frente à crise do coronavírus. Entre essas reivindicações, está a aplicação da lei que institui uma renda básica de cidadania para todos os brasileiros. Leia a íntegra da Carta:

CARTA DOS GOVERNADORES DO BRASIL NESTE MOMENTO DE GRAVE CRISE

O Brasil atravessa um momento de gravidade, em que os governadores foram convocados por suas populações a agir para conter o ritmo da expansão da Covid-19 em seus territórios. O novo coronavírus é um adversário a ser vencido com bom senso, empatia, equilíbrio e união. Convidamos o presidente da República a liderar este processo e agir em parceria conosco e com os demais poderes.

Reunidos, queremos dizer ao Brasil que travamos uma guerra contra uma doença altamente contagiosa e que deixará milhares de vítimas fatais. A nossa decisão prioritária é a de cuidar da vida das pessoas, não esquecendo da responsabilidade de administrar a economia. Os dois compromissos não são excludentes. Para cumprilos precisamos de solidariedade do governo federal e de apoio urgente com as seguintes medidas (muitas já presentes na Carta dos Governadores assinada em 19 de março de 2020):

1. Suspensão, pelo período de 12 meses, do pagamento da dívida dos Estados com a União, a Caixa Econômica Federal, o Banco do Brasil, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, e organismos internacionais como Banco Mundial e Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), bem como abertura da possibilidade de quitação de prestações apenas no final do contrato, além da disponibilização de linhas de crédito do BNDES para aplicação em serviços de saúde e investimentos em obras;

2. Disponibilidade e alongamento, pelo BNDES, dos prazos e carências das operações de crédito diretas e indiretas para médias, pequenas e microempresas. Demanda-se viabilizar o mesmo em relação a empréstimos junto a organismos internacionais;

3. Viabilização emergencial e substancial de recursos livres às Unidades Federadas, visando a reforçar a nossa capacidade financeira, assim como a liberação de limites e condições para contratação de novas operações de crédito (incluindo extralimite aos Estados com nota A e B), estabelecendo ainda o dimensionamento de 2019 pelo Conselho Monetário Nacional e permitindo a securitização das operações de crédito;

4. Imediata aprovação do Projeto de Lei Complementar 149/2019 (“Plano Mansueto”) e mudança no Regime de Recuperação Fiscal, de modo a promover o efetivo equilíbrio fiscal dos Entes Federados;

5. Redução da meta de superávit primário do Governo Federal, para evitar ameaça de contingenciamento no momento em que o Sistema Único de Saúde mais necessita de recursos que impactam diretamente as prestações estaduais de saúde;

6. Adoção de outras políticas emergenciais capazes de mitigar os efeitos da crise sobre as parcelas mais pobres das nossas populações, principalmente no tocante aos impactos sobre o emprego e a informalidade, avaliando a aplicação da Lei nº 10.835, de 8 de janeiro de 2004, que institui a renda básica de cidadania, a fim de propiciar recursos destinados a amparar a população economicamente vulnerável;

7. Apoio do governo federal no tocante à aquisição de equipamentos e insumos necessários à preparação de leitos, assistência da população e proteção dos profissionais de saúde.

Informamos que os governadores seguirão se reunindo à distância, no modelo de videoconferências – como preconizam as orientações médicas internacionais –, com o objetivo de uniformizar métodos e com vistas a alcançar, em um futuro breve, ações consorciadas, que nos permitam agir no tema de coronavírus e em outros temas.

No que diz respeito ao enfrentamento da pandemia global, vamos continuar adotando medidas baseadas no que afirma a ciência, seguindo orientação de profissionais de saúde e, sobretudo, os protocolos orientados pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

O Congresso Nacional deve assumir o protagonismo em defesa do pacto federativo, conciliando os interesses dos entes da federação, compatibilizando ações e canalizando demandas de Estados e municípios.

Por fim, desejamos que o Presidente Jair Bolsonaro tenha serenidade e some forças com os Governadores na luta contra a crise do coronavírus e seus impactos humanitários e econômicos. Os Governadores entendem que este momento exige a participação dos poderes legislativo, executivo, judiciário, da sociedade civil e dos meios de comunicação.

Juntos teremos mais força para superar esta grave crise no País. Assinam esta carta 26 Governadores:

João Doria - Governador de São Paulo

Wilson Witzel - Governador do Rio de Janeiro

Gladson Cameli - Governador do Acre

Renan Filho - Governador de Alagoas

Waldez Góes - Governador do Amapá

Wilson Lima - Governador do Amazonas

Rui Costa - Governador da Bahia

Camilo Santana - Governador do Ceará

Renato Casagrande - Governador do Espírito Santo

Ronaldo Caiado - Governador de Goiás

Flávio Dino - Governador do Maranhão

Mauro Mendes - Governador do Mato Grosso

Reinaldo Azambuja - Governador do Mato Grosso do Sul

Romeu Zema - Governador de Minas Gerais

Helder Barbalho - Governador do Pará

João Azevêdo - Governador da Paraíba

Ratinho Júnior - Governador do Paraná

Paulo Câmara - Governador do Pernambuco

Wellington Dias - Governador do Piauí

Fátima Bezerra - Governador do Rio Grande do Norte

Eduardo Leite - Governador do Rio Grande do Sul

Coronel Marcos Rocha - Governador de Rondônia

Antonio Denarium - Governador de Roraima

Carlos Moisés - Governador de Santa Catarina

Belivaldo Chagas - Governador de Sergipe

Mauro Carlesse - Governador do Tocantins

(*Com  Eduardo Simões e Rodrigo Viga Gaier - Reuters -G1 -Secom/ES)