ECONOMIA NACIONAL

Inflação se espalha e já castiga famílias de todas as faixas

A alta de preços dos alimentos básicos continua mostrando a sua cara ao longo de 2021.

Em 26/08/2021 Referência CORREIO CAPIXABA - Redação Multimídia

Foto: Pilar Olivares/Reuters

Gasolina, energia, óleo de cozinha, botijão de gás e carne são alguns dos principais vilões do aumento de preços em 2021.

Rico ou pobre, o brasileiro está hoje cercado de inflação por todos os lados. A alta de preços dos alimentos básicos, que vinha castigando as famílias de menor renda desde o ano passado, continua mostrando a sua cara ao longo de 2021. O preço da carne, por exemplo, passa de R$ 40 o quilo e subiu o equivalente a três vezes e meia à inflação geral, que acumula alta de 9,30% em 12 meses até agosto, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA)-15). O óleo de soja, o principal vilão do custo de vida, já beira R$ 8 a garrafa, e aumentou mais de oito vezes a inflação geral do período.

A diferença da inflação deste ano é que ela recebeu um componente altamente explosivo que fez a alta de preços se alastrar por toda a economia. Produtos que são considerados preços de referência, isto é, entram na formação de outros preços, como diesel, energia elétrica, por exemplo, dispararam e contaminaram os demais.

Deste grupo, o preço mais visível para o brasileiro de maior renda aparece na bomba de gasolina, com o litro vendido por até R$7. Para os mais pobres, o preço de referência é o gás de cozinha, cujo valor do botijão beira hoje R$ 100 e acumula alta de mais de 30% em 12 meses.

"A inflação deste ano está mais 'democrática': atinge ricos e pobres", resume o coordenador de índices de preços da Fundação Getulio Vargas (FGV), André Braz.

Ele explica que enquanto carestia batia só nos alimentos, os mais pobres eram os mais afetados, porque consomem mais esses itens. Enquanto isso, as famílias mais abastadas não tinham a percepção, na mesma intensidade, de que a inflação tinha disparado.

Impedido de gastar com serviços, de circular de carro e de viajar de avião por causa da pandemia, o estrato social de maior renda viu muitos preços de produtos e serviços que consumia estacionados ou até em queda no ano passado por causa do isolamento social. Com isso, os ricos conseguiram poupar.

Mas o que se vê neste ano é que a pressão de preços se espalhou. A desvalorização do câmbio, que turbinou as cotações em reais do petróleo e dos combustíveis, e a crise hídrica, que afetou a geração de energia e as tarifas e reduziu a produção agrícola, fizeram a inflação tomar outro rumo.

"Agora a inflação é percebida por todos", diz André Braz.

A alta do preço do arroz, prato básico que pesa no bolso do brasileiro comum, foi 36,89% em 12 meses até agosto. Esse aumento praticamente se equipara ao avanço do preço da gasolina no mesmo período, de 39,52%, e é consumida pelos mais ricos.

Esse espalhamento aparece no porcentual de itens que estão subindo de preço no IPCA-15. Em agosto, essa fatia é de 73,30 % e só perde para janeiro de deste ano, que foi de 73,84%. "Um resultado acima de 60% já seria problemático", frisa o economista da LCA Consultores, Fábio Romão. Um resultado na faixa de 70% revela, na sua avaliação, que a inflação está pegando todas as classes sociais.

Segundo o economista, há uma gama mais complexa de pressões inflacionárias atuando e também que estão a caminho. Elas estão nos serviços e nos bens industriais. Ele lembra, por exemplo, que, com a reabertura das atividades suspensas por conta do lockdown, há risco de a inflação de serviços disparar, já que as famílias de maior renda terão predisposição para gastar a poupança acumulada no período de fechamento. Também os bens industriais, que tiveram as cadeias de produção desorganizadas, ainda não voltaram à normalidade. Isso significa falta de peça, por exemplo, no carro zero, e mais inflação para o consumidor.

Até produtos que foram considerados símbolos do Plano Real, responsável pela estabilização da economia brasileira a partir de julho de 1994, após um longo período de hiperinflação, entraram para a vala comum da alta de preços.

Vinte sete anos atrás, o quilo do frango inteiro custava R$ 1. Hoje sai por quase R$ 10 e já subiu 22,89% nos últimos 12 meses até meados de agosto. O iogurte, outro ícone, no passado, da estabilidade econômica e de alimento acessível aos mais pobres por conta da queda da inflação, hoje está no polo oposto. O preço do produto subiu 14,09% nos últimos 12 meses até este mês, bem acima da inflação geral no período.

Com orçamento apertado, famílias atrasam conta de luz e água

O aumento dos preços tem pressionado as contas das famílias e exigido esforços para evitar que as dívidas se acumulem. Um exemplo é o de Érika Lima, de 39 anos, moradora de Paranavaí, no Paraná, que trabalha com mídias sociais em uma agência de publicidade.

Ela e o marido têm um pequeno serviço de comida japonesa por delivery, montado na própria cozinha de casa há 5 anos, o que ajuda a complementar o salário, pouco maior que o mínimo. Mas o aumento dos custos do dia a dia, especialmente alimentação, deixaram o orçamento apertado.

Com isso, ela precisou atrasar o pagamento de contas de energia, água e internet para conseguir manter o pagamento do aluguel em dia, que tem juros mais altos, e também a faculdade online da filha mais velha, para não perder o desconto na mensalidade que a instituição oferece.

"O dinheiro que ganho na agência, uso para pagar o aluguel. Já o dinheiro do delivery paga todas as outras contas", diz. "Pago água e luz só quando estão na iminência do corte, infelizmente. O cartão de crédito já virou bola de neve. Todo mês pago menos do que a fatura total."

Com o orçamento apertado, ela também teve de interromper as sessões de terapia e as consultas com nutricionista, inciadas em dezembro, para tentar resolver o transtorno de ansiedade e quadro depressivo.

"A terapia vinha me fazendo muito bem, mas a escalada do aumento dos gastos me obrigou a parar. As contas pararam de fechar de maio para cá e eu não tinha mais o que cortar", afirma.

A renda familiar caiu porque, além de seu pagamento ter sido reduzido em R$ 300 por causa da perda de um cliente da agência, o valor médio dos pedidos no seu restaurante caiu, sem falar que os produtos ficaram mais caros. O salmão, por exemplo, saltou de R$30 para R$ 72 desde o começo do ano, segundo ela.

"A única coisa que não subiu foi a taxa que a gente paga para o entregador, mas ele também é como nós, tem três empregos", falou.

Com a crise, ela também dispensou a auxiliar de cozinha, e a filha do meio passou a trabalhar com o casal. (Estadão Conteúdo)

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