NEGÓCIOS

A Petrobras ainda é um bom risco de crédito, afirma Roberto Setubal.

O presidente do Banco Itaú descarta que a incerteza com a Petrobras afete seus negócios..

Em 08/02/2015 Referência JCC

A operação Lava Jato, que vem dominando as manchetes ao longo dos últimos meses, tem lançado incertezas sobre toda a economia. No entanto, Roberto Setubal, presidente-executivo do Itaú Unibanco, o maior banco privado brasileiro, descarta a hipótese de que a incerteza com a Petrobras afete seus negócios. Segundo o banqueiro, o total emprestado pelo Itaú às empresas envolvidas nas investigações é relativamente pequeno – e, mesmo assim, esses empréstimos são considerados seguros. Ao divulgar um lucro recorde obtido pelo banco em 2014, na terça-feira 3, momentos depois de a demissão da presidente da Petrobras, Graça Foster, tornar-se pública, Setubal definiu a estratégia para os próximos anos, tanto no Brasil quanto na América Latina. Após a entrevista coletiva, ele conversou com a DINHEIRO.

DINHEIRO – O ano passado foi complicado e 2015 começou difícil. Qual é a sua perspectiva para este ano?
ROBERTO SETUBAL – 
A economia está passando por um ajuste necessário e deverá continuar assim no decorrer do ano. Não podíamos continuar aumentando o déficit fiscal e o de conta-corrente como neste último período. Nossas estimativas são de uma leve retração, cerca de 0,5% no Produto Interno Bruto (PIB) em 2015. Acredito que voltaremos a crescer já no ano que vem.

DINHEIRO – Mesmo com ameaças de apagão e com a crise hídrica?
SETUBAL –
 O impacto da escassez de energia elétrica e de água sobre a economia será relativamente pequeno. Em 2001, a redução na oferta de energia foi da ordem de 20%. Nossa estimativa agora é que, se houver necessidade de racionamento, ele levará a uma redução em torno de 5%, o que será um impacto muito menor na economia. Eu também não acredito em impacto relevante na nossa inadimplência.

DINHEIRO – O Itaú anunciou um lucro de R$ 20,6 bilhões em 2014, um crescimento de 30,2% em relação a 2013, com redução da inadimplência. O que sustentou esse ganho?
SETUBAL – 
O resultado foi excepcional. Com esse lucro, obtivemos uma rentabilidade patrimonial de 24%. Foi um ano excelente, a finalização de um trabalho que realizamos entre 2012 e 2014, e que visou aumentar a eficiência e a produtividade do banco. Os empréstimos cresceram 9,8% no ano, em comparação com 2013. Isso me pareceu um bom desempenho em um ano em que o PIB cresceu menos de 1%.

DINHEIRO – Para quem o banco está emprestando?
SETUBAL –
 Continuamos com nossa política de dar ênfase aos segmentos menos arriscados, como o crédito consignado e os empréstimos imobiliários. Nesses segmentos, o crescimento da carteira foi superior a 20%. A participação dos empréstimos consignados em nossa carteira mais do que triplicou em quatro anos, subindo de 2,9% em 2011 para 9% em 2014. Outro destaque foi o financiamento a grandes empresas, que avançou mais de 14%. Atualmente, os créditos para grandes empresas são a fatia mais representativa dos empréstimos, com 30,4%.

DINHEIRO – O banco desacelerou os empréstimos há dois anos, e agora voltou a emprestar. Por que essa pausa?
SETUBAL –
 A partir do fim de 2011, deliberadamente focamos na qualidade do crédito, cientes de que isso levaria a um crescimento menor dos empréstimos, como de fato ocorreu, em 2012 e 2013. Para compensar esse efeito, nos concentramos no aumento das receitas de serviços e de seguros, e na melhoria da eficiência operacional. Essa estratégia reduziu o risco de nosso balanço e nos deixou mais bem preparados para enfrentar um período difícil que se afigurava já a partir de 2014. O fato de nos concentrarmos em empréstimos de menor risco, como os consignados e os créditos imobiliários, fez com que a inadimplência total da carteira para atrasos de mais de 90 dias caísse de 3,7%, em 2013, para 3,1% em 2014. É o menor nível desde a fusão do Itaú com o Unibanco. Já em 2014, tivemos um crescimento melhor e com boa qualidade.

DINHEIRO – Quais são as perspectivas para o crédito em 2015?
SETUBAL –
 O crescimento do volume de empréstimos, neste ano, deverá ser um pouco menor do que o de 2014. Outro ponto forte é que a base de capital do banco já atende às necessidades de capital exigidas para 2019. Ao longo de 2014, elevamos gradualmente nosso nível de provisões e estamos mantendo um percentual capaz de enfrentar uma eventual deterioração da qualidade do crédito em 2015, mas não esperamos nada muito grave.

DINHEIRO – Como está a atuação no exterior? O Itaú pretende comprar algum banco no México, como se especula?
SETUBAL – 
Ambicionamos ser o banco líder na América Latina e estamos crescendo. Em 2014, anunciamos a fusão com o Corpbanca (banco chileno-colombiano). Quando ela for finalmente aprovada pelas autoridades e pelos bancos centrais do Brasil, do Chile e da Colômbia, vai nos tornar o quarto banco de varejo no Chile e o quinto na Colômbia. Com a conclusão dessa transação, atingiremos uma diversificação relevante em nosso balanço, teremos cerca de 20% de nossos empréstimos nos países da região. Neste momento, essas são as nossas principais iniciativas na América Latina. Estamos focados na conclusão dessa transação. Não temos nenhum outro grande negócio em vista.

DINHEIRO – E na Argentina?
SETUBAL – 
Nossa atuação na Argentina está em compasso de espera. Temos alocado poucos recursos, e o que fazemos é muito mais para aproveitar oportunidades específicas. Temos de esperar uma definição da situação política e econômica no país, para decidirmos nossa estratégia.

DINHEIRO – O sr. esteve recentemente no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça. O discurso do ministro Joaquim Levy agradou ao mercado? Os investidores internacionais estão mais animados com o Brasil?
SETUBAL – 
O ministro Levy deixou uma ótima impressão em Davos. Ele descreveu as medidas que está tomando para tornar sustentável a situação fiscal do governo brasileiro. Suas declarações levaram confiança aos investidores internacionais. O Brasil permanece um local interessante para investir. É um grande mercado, dos maiores do mundo, e com bom potencial de crescimento.

DINHEIRO – O que atrai os investidores?
SETUBAL – 
Há grandes e excelentes oportunidades de investimento, especialmente no setor de infraestrutura. Há diversas obras necessárias: estradas, portos, aeroportos, usinas de geração de energia. Essas obras são tão necessárias para a sociedade e para a economia brasileiras que é impossível que não sejam atrativas para os investidores. Só é preciso que haja segurança jurídica e um modelo de negócios claro e atraente. Garantido isso, os investimentos virão.

DINHEIRO – Mesmo com a economia brasileira em um ritmo fraco?
SETUBAL – 
A economia está fraca, mas há algumas maneiras de fazer com que volte a crescer. Talvez a melhor forma de estimular o crescimento seja a exportação. Outra possibilidade é uma privatização mais intensa de investimentos em infraestrutura, pois ainda há muita coisa a ser feita no Brasil. Essas políticas são oportunidades para estimular a economia no médio prazo. Além disso, os Estados Unidos estão retomando seu crescimento de modo sustentável, o que aumenta a demanda nos outros países, beneficiando a China e, indiretamente, o Brasil. A economia americana ainda continua sendo a locomotiva do mundo, e quando os Estados Unidos vão bem, os demais países são beneficiados. Isso vai ajudar a aumentar as exportações ao longo dos próximos anos.

DINHEIRO – O sr. acabou de tomar conhecimento da demissão da presidente da Petrobras, Graça Foster. Era algo esperado? Qual o impacto disso para o banco? 
SETUBAL –
 Prefiro não fazer comentários sobre a saída da presidente da Petrobras. Acredito que a presidenta Dilma Rousseff saberá encontrar um sucessor capaz de conduzir bem a empresa. Mesmo assim, o impacto das investigações da Operação Lava Jato sobre o Itaú é pequeno.

DINHEIRO – Mesmo com algumas das maiores empresas do País envolvidas? O Itaú vem se concentrando em empréstimos para grandes empresas, e a Lava Jato não pode piorar a qualidade de crédito do banco?
SETUBAL – 
O total emprestado pelo banco a empresas envolvidas na investigação é pouco representativo na nossa carteira total. E é preciso ter em mente que muitas dessas empresas são parte de grupos empresariais de grande porte e com atividades diversificadas. Isso aumenta a capacidade de pagamento dessas empresas. Não quero citar nomes, mas alguns dos grupos têm outros grandes clientes além da Petrobras, inclusive fora do País, e outras atividades, como geração e transmissão de energia elétrica, ou a exploração de concessões como rodovias e aeroportos. Essas atividades são executadas por empresas sólidas e independentes, e não são afetadas pelas investigações da Lava Jato. Por isso, não estamos preocupados com o efeito da Lava Jato sobre a qualidade do crédito desses grandes grupos.

DINHEIRO – O banco divulgou que 3% dos empréstimos são concedidos para o setor de óleo e gás. Emprestar tanto dinheiro para a Petrobras não eleva os riscos?
SETUBAL – 
Esse número de 3% que está em nosso balanço se refere a diversas empresas no Brasil e no exterior. Temos créditos para empresas do setor de óleo e gás fora do Brasil, por isso é incorreto dizer que todos esses empréstimos foram concedidos para a Petrobras ou empresas envolvidas na Lava Jato.

DINHEIRO – Os empréstimos para a Petrobras não o preocupam?
SETUBAL – 
Não vejo hipótese de a Petrobras tornar-se inadimplente. A Petrobras é uma grande empresa e, apesar dos problemas recentes, nós ainda a consideramos um bom risco de crédito.

Fonte: Dinheiro