MEIO AMBIENTE

Lagoa recebe rejeitos da Samarco em Anchieta e pescadores reclamam.

A Mãe-Bá é a segunda maior lagoa do estado e tem água turva.

Em 04/12/2015 Referência JCC

Os pescadores de Anchieta, na região Sul do Espírito Santo, reclamam da situação da água da segunda maior lagoa do estado, a Mãe-Bá, que recebe resíduos da Samarco, cujos donos são a Vale e a anglo-australiana BHP Billiton. Segundo os relatos, local que antes tinha água limpa não possui mais peixes.

"Acompanho o noticiário todo dia. O negócio é que lá (em Mariana) foi uma porrada só, aqui eles estão fazendo isso de pouquinho em pouquinho. Quando eu era criança as pessoas bebiam água direto da lagoa, sem nem tratar. Hoje ninguém tem coragem de tomar banho. Aqui tinha garça, tinha tucunaré. Onde você parava o barco, conseguia ver o fundo", contou um pescador de 43 anos que não quis se identificar.

O relato do pescador é compartilhado por outros pescadores da região. A Mãe-Bá é um manancial inóspito, sem vida aparente. Se antes fornecia peixes em abundância e água limpa para a população do entorno, agora recebe os rejeitos da produção da Samarco.

A mineradora atua às margens da lagoa desde 1977 e a utiliza como receptora da água residual gerada nos processos produtivos da indústria no estado e até mesmo proveniente da unidade de Germano, em Minas Gerais, que chega até o Espírito Santo através de um mineroduto. A empresa também represou parte dela, constituindo a Barragem Norte.

Água turva e vermelha
Morando às margens da lagoa, Wever Castilho, conhecido como Passarinho, convive com uma água completamente turva. "Quando o vento está nordeste, a gente vê mais de meio metro de espuma nas margens da lagoa. Que lagoa você conhece que faz espuma?", indagou.

Passarinho costuma tirar fotos do que considera abuso da empresa. Além da poluição na lagoa, há o "pó preto" nas casas e carros. "Quando está tudo funcionando você vê a nuvem vermelha que sai da empresa. Para onde isso vai?", questionou.

Algas nocivas
O biólogo e mestre em biologia vegetal Adriano Goldner Costa realizou um estudo na lagoa Mãe-Bá, durante três anos, para identificar o potencial de proliferação de cianobactérias, algas que podem ser nocivas ao ser humano.

O período estudado foi até 2008 e o especialista constatou que, desde que a mineradora começou a atuar e a Barragem Norte foi formada, o ecossistema tem sofrido influência não só de fatores climáticos, mas também das aberturas da barragem. "O que acontece com a lagoa é um espelho, em menor escala, do que está acontecendo com o Rio Doce", disse.

A água verde encontrada na Barragem Nova mudou a coloração. Segundo o professor, se trata da proliferação de microalgas que podem ser nocivas.

"A barragem vira um grande tanque de sedimentação. Ali, além do que vem do efluente, escoa matéria orgânica e inorgânica. O acumulado ali gera um ambiente propício para microalgas e algumas dessas algas podem ser nocivas. Quando abrem as comportas e lançam essas algas na lagoa, como são formas de vida oportunistas, vão parar no ecossistema", explicou.

O biólogo ainda chama atenção para a abertura das comportas, que acontecem pelo menos quatro vezes por ano e permanecem abertas por 72h em média. Além de levar até a lagoa esses organismos, a barragem tem influência mecânica.

"O que sai da barragem traz para a superfície da lagoa todo o sedimento dispensado no local que havia se acumulado no fundo, o que reflete diretamente na qualidade da água", determina Costa.

Multas
A mineradora já foi multada pelo menos seis vezes desde 1993 por despejo de poluentes na lagoa e no mar de Anchieta. Uma das multas, calculada na época em 139,5 milhões de cruzeiros, era referente à poluição dos locais com um óleo tóxico e cancerígeno, utilizado como lubrificante para capacitadores e transformadores elétricos, mas proibido por portaria ministerial de ser utilizado no país desde 1981.

Em 2008, a mineradora também foi multada, desta vez em R$ 1.327.543, por poluição em Mãe-Bá e na Praia do Além, em Anchieta. Técnicos do Iema constataram a presença de pó de minério sobre a areia, a vegetação de restinga e a água.

Iema
O Instituto Estadual de Meio Ambiente (Iema) informou, por meio de nota, que o Complexo de Usinas de Pelotização da Samarco, em Anchieta, possui Licença de Operação vigente.
"Este empreendimento possui também uma barragem para armazenamento de efluentes industriais, chamada Barragem Norte", explicou a nota.

O efluente armazenado na Barragem Norte passa ainda por uma Estação de Tratamento de Efluentes Industriais antes de ser lançado na Lagoa de Maembá. Esse lançamento, por exigência do Iema, é feito obedecendo limites ainda mais restritivos do que estabelece a legislação vigente (Res. Conama 430-2011).

Quanto à presença de peixes no corpo hídrico, foram realizadas investigações quanto aos níveis de toxidade na lagoa e os mesmos se apresentaram dentro dos padrões. Também foram analisados peixes presentes no local, que não indicaram contaminação relacionada ao lançamento de efluentes industriais.

Além disso, em corpos hídricos com água parada como a Lagoa Mãe-Bá, há também a deposição no fundo de matéria orgânica, que ao longo do tempo entra em decomposição podendo causar mau cheiro.

A Samarco é obrigada a monitorar a qualidade da água e dos sedimentos em pontos estratégicos da Lagoa Mãe-bá, sendo que nos dois últimos anos tais resultados estavam em conformidade com a legislação (Res. Conama 357/2005 e 454/2012)".

Samarco
Segundo a mineradora, "a planta industrial da Samarco, em Anchieta, possui estações de tratamento e recirculação da água, o que permite um reaproveitamento de aproximadamente 90% do recurso. O restante é tratado, de acordo com os padrões e as exigências legais, e lançado na lagoa de Mãe-Bá.

A lagoa é submetida à análise nos aspectos físico-químico e biológico, considerando 48 parâmetros. A Samarco também monitora a diversidade e a ecologia de peixes no local. São oito pontos de monitoramento na lagoa, realizando cerca de 3 mil análises todos os anos".

Sobre a situação das multas, a Samarco informou, por meio de nota, "que está, e sempre esteve, em constante diálogo com os órgãos públicos, cumprindo e arcando rigorosamente com suas obrigações legais e ambientais nos âmbitos municipal, estadual e federal, conforme determina a legislação".

Fonte: G1-ES