CIDADE

Ônibus turístico de SP tem percurso de 3 horas e narração sem sincronia.

Serviço estreou em caráter experimental no sábado e custa R$ 40.

Em 16/03/2016 Referência JCC

O ônibus de dois andares para turistas conhecerem 11 principais cartões postais de São Paulo roda pelas ruas da capital feito um carro alegórico. Basta fechar o farol para que dezenas de pessoas saquem seus celulares engatilhados na câmera. O serviço foi inaugurado pela Prefeitura no sábado (12) com bilhete a R$ 40.

Do lado de fora, a reação é de curiosidade. No interior do veículo, a novidade é avaliada positivamente, embora o serviço seja falho e, por vezes, mais confunda do que informe. A narração, em diversos pontos, não está sincronizada com a atração do momento. Ora descreve com muita antecedência, ora retardo.

Sobre o ônibus turístico de São Paulo:
- Em circulação desde sábado (9);
- Por enquanto, apenas um ônibus faz o serviço;
- Ingresso custa R$ 40 e dura 24 horas;
- Saídas de segunda a sábado às 9h, às 12h40 e às 16h; aos domingos e feriados, às 10h, às 13h40 e às 17h a partir da Praça da Luz.
- Paradas: Mercado Municipal, República, Pacaembu, Paulista-Masp, Ibirapuera, Centro Cultual São Paulo, Pateo do Collegio e Theatro Municipal;
- A volta completa demora cerca de 3 horas.

No tour acompanhado pela reportagem do G1 na tarde desta segunda-feira (14), o áudio reproduzido em três idiomas - português, inglês e espanhol - repetiu a explicação sobre o estádio do Pacaembu quando o cenário era a Rua da Consolação. Os passageiros perceberam: "Ué, de novo?", comentaram.

Na sequência, a gravação fez turistas do Recife acharem que a Rua Haddock Lobo era a famosa Rua Augusta, e se perguntarem "Cadê o Masp, não falaram do museu?".

Os dois destaques da Avenida Paulista foram citados quando os pneus dianteiros do ônibus começavam a lamber a via. Cedo demais. O mesmo problema ocorreu na Avenida Ipiranga. Copan e Praça Roosevelt vieram feito um spoiler, ainda na Praça da República, durante uma parada de dez minutos.

Estragou. Quando o edifício projetado por Niemeyer despontou à esquerda, o relato já caíra no esquecimento. Os passageiros olhavam para um ponto turístico fora do roteiro: "Olha, essa é balada famosa", disseram sobre a Love Story. Já a Praça do Ciclista exigiu um exercício de percepção e memória: foi informada quando não era mais possível localizá-la: o veículo estava próximo à cruzar a Rua Peixoto Gomide.

Em nota, a SPTrans diz que o serviço está funcionando "em caráter experimental". A companhia também afirma que os pontos são acionados através de um GPS, localização por satélite, instalado em um tablet que fica na cabine da motorista.

"Pode ocorrer que a informação seja atrasada ou adiantada de acordo com o ponto, pois como é necessário repetir a informação em 3 idiomas, dependendo do trânsito, semáforo e outros obstáculo na via, há alteração no local em que o áudio está sendo executado", defende o texto.

A tecnologia mambembe, porém, é compensada por funcionários extremamente bem intencionados e um folder com explicações mais abrangentes. A boa vontade do cobrador Israel Alves Bunça salva no conhecimento e livra os solitários do tédio em caso de baixo quórum - e/ou congestionamento sem fim. Com sorte no trânsito, o tour tem duração de três horas.

Ao passar pela região Central, Bunça aponta para o prédio onde está a Bolsa de Valores. A informação é complementar à narração, e feita por livre e espontânea vontade. "Ninguém me mandou falar, mas eu ando bastante pela cidade e sei onde é, acho importante contar", explica.

Sem a disponibilidade do rapaz, identificar o Solar da Marquesa de Santos, quando o tour percorre a região do Pateo do Collegio, se torna um jogo de apostas. "O que o áudio não explica, não aponta, eu complemento. Sou curioso, gosto de ler, estudar, saber das coisas da cidade", revela.

O corpo fala
Em português a informação é farta, mas nos demais idiomas, carente. "É, infelizmente eu não tenho o inglês", diz o cobrador. A motorista Priscila Souza, uma das quatro mulheres destinadas a operar a linha, também gostaria de dominar outras línguas, e lamenta a ausência de uma pessoa dentro do veículo para melhorar o serviço prestado aos gringos.

Por volta das 15h30, quando a reportagem chegou ao ponto de onde partem os ônibus, na Praça da Luz, próximo à esquina da Rua Mauá, Priscila tentava explicar (no caso, gesticular) para um casal de canadenses que, durante a viagem, haveria informações em inglês. "A gente se esforça, tenho que ter jogo de cintura e traduzir na mímica", diz a motorista.

Ana Trubiano, de 61 anos, e o marido, ambos de Montreal, buscavam dados prévios para decidir se usariam o serviço nesta segunda, ou em outro dia e mais cedo. Ana domina o italiano e arriscava, pela sonoridade das palavras, decifrar o que Priscilava dizia em português.

Em São Paulo para visitar a filha e conhecer o neto, nascido há cinco dias, os canadenses planejavam um dia de folga da função de avós para serem apresentados também à cidade. Em 2015, quando estiveram pela primeira vez na capital, já sentiram falta da informação sobre os pontos turísticos e de um serviço dedicado aos estrangeiros.

"Ninguém sabe nos informar onde conseguir um mapa. Uma cidade deste tamanho, precisamos saber os bairros, a melhor forma de nos locomover", analisa Ana. Apesar dos entraves da língua, eles avaliaram a iniciativa do ônibus como "maravilhosa". "É bom andar a pé, mas a gente se depara com muitos prédios, muita coisa bonita e interessante, e não sabe o que significa."

A SPTrans também afirma que irá avaliar a compra de novos ônibus ou a contratação de um funcionário que tenha fluência em mais um idioma após os primeiros meses de circulação do coletivo.

Recomendações
O percurso está sujeito às variações de tempo e trânsito. No tour acompanhado pelo G1, o passeio começou um com uma hora de atraso, às 17h. Os horários são fixos, mas é possível checar se o ônibus sairá conforme o programado através do aplicativo Moovit.

Dentro do ônibus, o wi-fi funciona bem, mas é preciso fazer um cadastro no site da SPTrans para utilizá-lo. É jogo rápido. Único problema: o formulário exige o CPF, o que, por enquanto, inviabiliza o acesso a estrangeiros. De acordo com funcionários, o sistema deve ser alterado para permitir colocar dados do passaporte ou o wi-fi passará a ser livre.

Vale acompanhar o passeio no andar superior, que tem as laterais abertas. Se chover, há capas de chuva. Para o último tour, um agasalho é boa companhia até para casais apaixonados. O ventinho noturno chega a incomodar. O segundo piso, embora permita uma visão e fotos mais interessante, requer atenção e agilidade para não ser atingido pelos galhos de árvores que inúmeras vezes "invadem" o espaço.

O cobrador garante que a motorista faz o possível para não machucar os turistas tampouco as árvores. "A gente tenta desviar, mas depende das pessoas darem passagem no trânsito", explica. No ponto de parada em frente ao Monumento às Bandeiras, a veículo precisa estacionar longe da guia por conta dos galhos das árvores.

Sobre o problema, a SPTrans alega que há podas previstas para os próximos dias, mas afirma que "apenas na região central podas precisam ser refeitas e estão sendo equacionadas pela subprefeitura."

Outro alerta: o passeio é, definitivamente, um programa pouco recomendado para crianças. Um casal de Salvador, na Bahia, utilizou o serviço nesta segunda acompanhada do filho de três anos. Além de sono, o trajeto deu fadiga. Ao final da jornada, o menino avaliou: "É chato. Gostei só um pouquinho."

O G1 não encontrou nenhuma placa ou informe sobre o serviço turístico nos arredores do ponto de partida. Para localizar o ônibus, a reportagem pediu informações aos funcionários da Estação Luz do Metrô. Um abrigo devidamente caracterizado será construido em breve, segundo a SPTrans. "Por conta da interdição parcial do Museu, o ônibus está temporariamente partindo do ponto localizado na frente da Estação Luz", explica a companhia.

O serviço funciona de segunda a sábado, com viagens às 9h, às 12h40 e às 16h. Aos domingos e feriados, às 10h, às 13h40 e às 17h. O ponto de partida será, sempre, da Praça da Luz, quase na esquina com a Rua Mauá. Em frente à Estação da Luz, que segue fechada após o incêndio no Museu da Língua Portuguesa.

Por enquanto, há apenas um veículo operando a linha. O ingresso custa R$ 40 e tem duração de 24 horas. É permitido ao turista descer nos pontos de parada e gastar mais tempo em museus e outras atrações que interessar, mas vale planejar antes onde interromper a viagem, pois será preciso esperar o ônibus recomeçar o trajeto para conseguir terminar o percurso no mesmo dia.

Fonte: G1