ESPORTE INTERNACIONAL

Pelé negocia para ser garoto-propaganda do Catar-2022.

Projeto amplo, que inclui hospital, baile de gala e Pelezinho.

Em 19/01/2016 Referência JCC

Detentora dos direitos de imagem de Pelé, a empresa Sport 10 negocia com o comitê organizador da Copa do Mundo do Catar para que o maior jogador de futebol de todos os tempos se transforme no principal garoto-propaganda do torneio de 2022. A parceria incluiria atividades que seriam colocadas em prática anos antes do início da competição.

Um livreto digital com todo o planejamento e detalhes da iniciativa foi disponibilizado há dois meses no portal ISSUU, uma plataforma digital que reúne publicações do mundo todo e diz ter 25 milhões de documentos e 100 milhões de visitantes únicos por mês.

O material diz que a utilização do nome e da imagem de Pelé pelo Catar "criará estabilidade e credibilidade ao torneio". O texto cita os recentes escândalos da Fifa e apresenta atleta do século XX como "símbolo de esperança em tempos de incertezas no futebol".

A autenticidade do material foi confirmada por uma pessoa próxima à empresa. O executivo inglês Paul Kemsley, criador da Sport 10, procurou o GloboEsporte.com e disse que a publicação da notícia poderia atrapalhar a negociação. O livreto foi disponibilizado no portal ISSUU por um designer identificado apenas como "chris684". Até o momento da publicação desta reportagem, o livreto continuava disponível para consulta online (veja aqui, em inglês). 

Projeto

O projeto prevê a presença de Pelé em tour pelos estádios da Copa, em uma academia de talentos no Catar, um baile de gala anual, a possibilidade de construção de um hospital infantil, exposições, lojas e até a utilização do personagem Pelézinho como mascote da competição. 

A Sport 10 tem Pelé como um dos sócios (ele é dono de 30% das cotas da empresa, constituída nas Ilhas Cayman, com uma filial em São Paulo). As tratativas, entretanto, estão estacionadas. Há a apreensão entre os gestores da imagem de Pelé com a possibilidade de o Catar perder o direito de organizar a Copa – algo que ganhou força após as ações da Justiça americana e do Comitê de Ética da Fifa, que afastou o ex-presidente Joseph Blatter e resultou na demissão do Secretário-Geral Jérôme Valcke.

O ex-jogador também quer se proteger das controvérsias que envolvem a competição de 2022. Uma de suas exigências é de uma cláusula que estipule multas e permita a rescisão do acordo se notícias relacionadas ao uso de trabalho escravo nas obras da Copa, por exemplo, surgirem durante a vigência do contrato.

A saúde de Pelé, de 75 anos, é outra preocupação. No ano passado, foi internado três vezes: a primeira em maio, com um quadro de hiperplasia benigna na próstata, a segunda em julho, para uma cirurgia na coluna, e a terceira em dezembro, quando passou por nova operação, desta vez no quadril.  Antes, em 2014, ficou duas semanas no hospital por problemas no rim.

Apesar disso, o planejamento prevê a participação in loco do Rei do Futebol na maior parte das atividades até 2022, quando ele terá 82 anos.

"Paraíso"

Com 253 páginas e ilustrado com as mais simbólicas imagens da carreira de Pelé, o livreto é chamado de "Pelé & Qatar – A Match Made in Football Heaven" (Pelé & Catar – Uma Partida no Paraíso do Futebol, em tradução livre). A primeira parte apresenta a "lenda".

"Este livro foi criado para apresentar a oportunidade para Pelé representar o futebol da Federação do Catar e o país, que continua elevando seu status na comunidade do futebol", afirma um dos textos, que termina dizendo que a parceria ajudará a "garantir o espetáculo e o legado do torneio".

Em seguida, mostra dados das redes sociais do ex-jogador e os compara aos de outras lendas, como o golfista Tiger Woods, o boxeador Muhammad Ali e o jogador hóquei no gelo Wayne Gretzky.

O segundo capítulo foca nas possíveis relações entre Pelé e Catar. Tratado como "esperança" do futebol, a publicação diz que o ex-jogador foi "incitado por muitos a se candidatar à presidência da Fifa nas eleições de 2016" – "Um trunfo de valor inestimável para o Catar", completa.

Iniciativas

"Há notícias negativas e grande controvérsia sobre trabalhadores imigrantes trazidos para trabalhos cansativos nos estádios, em péssimas condições, com alguns que teriam morrido em consequência disso".

O projeto desenvolvido pela Sport 10 menciona as notícias que orbitam as obras das 12 arenas previstas para a Copa para sugerir um tour pelos estádios com a presença de Pelé. O Rei "não só levaria alegria e energia positiva aos trabalhadores, como mostraria ao mundo os progressos dessas estruturas multibilionárias". 

Através da produção de um documentário, Pelé também atuaria como observador da "Aspire Academy", um programa fundado em 2004 para o desenvolvimento de jovens atletas do Catar. Ele daria palestras, dicas de treino e apontaria suas apostas como futuras estrelas do futebol para um filme que seria distribuído mundialmente às vésperas da Copa.

Um baile de gala anual também está previsto para reunir celebridades e atrações musicais – Stevie Wonder, Beyonce e Paul McCartney são citados.

Lojas e cafés seriam construídos em shoppings do Catar para a venda de produtos licenciados, exposições sobre a vida de Pelé seriam abertas e uma "Pelé Station" seria construída próxima ao principal estádio da competição – o do Al Gharafa é usado como exemplo –, com experiências interativas e jogos sobre o ex-jogador.

Pelézinho, personagem criado por Maurício de Sousa na década de 1970 "que transmite paz, esperança e prosperidade", seria a mascote da Copa e estaria presente em todas as ações de marketing e peças promocionais.

A Sport 10 também imagina a criação de um centro satélite do Hospital Pequeno Príncipe, instituição curitibana que é referência no tratamento infantil e que mantém parceria com Pelé em um instituto de pesquisa na capital paranaense. A primeira opção seria criar uma parceria com uma entidade semelhante no país árabe, ou "talvez construir uma unidade do Pequeno Príncipe no Catar".

Procurada, a assessoria de imprensa da Maurício de Sousa Produções disse não ter informações sobre negociações pelos direitos de Pelézinho. Já o diretor corporativo do Complexo Pequeno Príncipe, José Álvaro Carneiro, admitiu conversas "embrionárias" com autoridades do Catar para a troca de experiência.

– Ainda é uma coisa que está muito na semente. Já estive algumas vezes no Catar, nossa especialidade é em diagnóstico precoce e no uso de genômica, nisso a gente pode afirmar que é tão bom quanto qualquer um. Mas é um estágio bem embrionário – afirmou.

A publicação não apresenta os valores envolvidos na possível parceria e termina com um catálogo completo das peças que compõem o acervo pessoal de Pelé, com mais de 2.000 objetos colecionados durante a carreira.

O Comitê Organizador da Copa do Mundo de 2022 foi procurado por e-mail, mas não respondeu às perguntas da reportagem.

Fonte:GE